terça-feira, 22 de julho de 2008

A função de Deus...


É muito comum quando vêm aos nossos ouvidos aquela passagem bíblica em que o povo de Israel, no período do Êxodo, fez um bezerro de ouro e começou a adorá-lo e cultuá-lo como um deus. Imediatamente interpretamos este trecho como um exemplo nítido de idolatria.
Daí surgem pregações empolgadas que apresentam os “bezerros” dos dias de hoje: o dinheiro, a promiscuidade, a as religiões da “Nova Era” e seus derivados... Enfim, ficaríamos uma eternidade enumerando os ídolos. Às vezes eu penso em pegar um caderninho e começar a notar cada um deles, pois nunca se sabe, podemos ser pegos de surpresa adorando algum deles. Alguns até nem conhecíamos, aí saímos da palestra morrendo de curiosidade pra saber como são.
Bem, nem precisamos aprofundar sobre esse gênero de evangelização, que ao invés de apresentar Deus a partir do que Ele é, fala mais do que Ele não é... Fazendo uma grande propaganda do contrário... Mas isso não vem ao caso...
Só que essa exortação tão preocupada em libertar o povo das “falsas doutrinas” surgiu bem depois, sobretudo quando começou a evangelização dos pagãos, como uma maneira de livrar os gentios de todos os costumes de suas religiões. Tudo bem que muitos elementos pagãos foram assimilados pelo cristianismo, mas mais uma vez não vem ao caso agora...
O importante é que foi esquecido o verdadeiro pecado cometido pelo povo Hebreu naquele episódio: o pecado da manipulação sagrado. Aquele povo ao confeccionar um bezerro de ouro não estava adorando a um outro deus ou praticando o politeísmo. Eles tinham consciência que o Deus deles não era aquela peça de ouro, mas que a partir daquela peça eles estavam cultuando o Deus Iaweh, só que agora ele poderia ser visível a eles, que o conduziam a onde quisessem. Podemos dizer que tentaram limitar Deus em suas mãos (qualquer semelhança com algo que vemos nos dias de hoje é mera coincidência).
Hum... Olhando por esse aspecto a pregação inflamada que citamos antes ganha um novo sentido. Uma vez que o verdadeiro perigo, ou melhor, o perigo a ser sanado primeiro é justamente aquilo que de fato ofende a Deus, tentar manipula-Lo ou dar a Ele uma responsabilidade que não lhe pertence.
“Deus provê, Deus proverá”... É claro que isso é verdade, mas não faça nada pra ver o que acontece... Nada! É muito bonito cantar “Espera no Senhor”, mas lembremos como Moisés e seu povo esperaram no Senhor... Caminhando... Literalmente se lascando no deserto... Fazendo a sua parte.
Pra ficar mais fácil de entender isso, tomemos a frase de Jesus: “Nem todo aquele que me diz ‘Senhor! Senhor! ’ Entrará no Reino dos Céus, mas sim aquele que faz a vontade do Pai”. Vontade do Pai... Essa é outra questão muito deturpada ultimamente. Tudo é vontade do Pai... Nem sei por que Deus nos fez livres... Pois muitos se colocam como marionetes nas mãos de Deus e esperam que Ele faça tudo, que tome até as decisões... Vai esperando então!
Deus após criar o homem e a mulher disse para que eles dominassem a terra e todos os seus animais, não que deixassem a vida os levar pra ver aonde dá...
Esse é o maior dom que Deus nos deu: participar da sua liberdade. Mas ao agirmos com liberdade temos que ter consciência de que temos que acolher as conseqüências. O exemplo do casal no Éden mostra isso claramente.
O povo de Israel não foi obrigado por Deus a sair do Egito, eles necessitavam sair, porém corriam o risco de não conseguir. A única certeza que tinham, pela fé, era que Deus estaria do lado deles, caminhando com eles, não caminhando por eles.
Será que muitas vezes não queremos que Deus caminhe por nós e queremos que Ele mostre o caminho a seguir? O pior é quando interpretamos todos os “sinais” para nos conduzirem àquilo que queremos que seja a vontade de Deus. Olha o bezerro aí de novo!
Quase sempre esperamos que Ele nos dê a certeza absoluta de que a decisão que queremos tomar será a certa. Não esqueçamos: “podereis comer dos frutos de todas as árvores do jardim, menos de uma...” Sabemos discernir entre o bem e mal, isso nos basta! Em qualquer decisão que tomarmos, Deus estará conosco, mas a decisão é nossa.
E como o povo Hebreu, corramos o risco. Quem foi que disse que é proibido se arriscar? O Êxodo que poderia ser feito em 40 dias durou quarenta anos! Deus os abandonou? Não! Muitas vezes agiu com a sua providência? Sim! Porém quem caminhou? O Povo!
“É para que sejamos livres que Cristo nos Libertou” é o que diz o apóstolo Paulo aos Gálatas. Cristo para nos libertar se encarnou, se fez homem e assumiu em tudo a condição humana, exceto no pecado. E teimamos em não assumir os riscos de sermos humanos livres e autores das nossas escolhas. Preferimos, por vezes, ficar com a cabeça nas nuvens esperando que Deus mande tudo pronto. E deixamos de acolher as verdadeiras oportunidades que Deus permite em nossa vida...
Na maioria das vezes nos escondemos atrás do bezerro... E continuamos apenas louvando e cantando... E esperando a vida acontecer sem nunca ousar pôr-se a caminho e adentrar no deserto e caminhar, caminhar... Pensamos que estamos servindo ao Senhor... De certo modo sim. É o Deus verdadeiro, mas infelizmente limitado no bezerro, ou pior na consciência... Num Deus segundo a nossa própria vontade.
Por isso é melhor continuar apenas com a pregação contra as “Falsas doutrinas”, pois não precisaremos mexer no conceito que temos de Deus... Nem na “função” que damos a Ele. É mais cômodo!

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